Mesa com Stelio Torquato, Crispiniano Neto e Arievaldo Viana. Espaço do Cordel e do Repente. Bienal do Livro de São Paulo, 2018. |
A notícia do encantamento do poeta cearense Arievaldo Viana me pegou de surpresa, pois, mesmo sabendo que ele se encontrava hospitalizado, com um quadro agravado por uma infecção, a sua vontade de viver era tanta, e seu amor pelas histórias e pelo sertão-velho era tão grande, que eu passei a crer num milagre que, infelizmente, não veio. E Ari, como carinhosamente o chamávamos, se despediu precocemente da vida aos 52 anos, a mesma idade que tinha Leandro Gomes de Barros (1865-1918), quando deixou a esfera terrena. Desde que Dulcimar Viana, a Dulce, esposa de Klévisson Viana e cunhada de Ari, me deu a notícia, por volta das 12h30min do dia 30 de maio, uma grande tristeza se apossou de minha alma. Um dia depois, quando finalmente reuni forças para postar este texto no blogue, a tristeza não arrefeceu em nada.
Perdi um amigo, um irmão, um
professor. A pessoa com quem mais eu conversava sobre os cordéis clássicos, as
histórias dos tempos idos e os sonhos dos tempos vindouros. E muitas memórias afloraram,
boa parte delas de momentos alegres, já que Ari era, no cordel e na vida, uma
pessoa muito bem-humorada. Ouso dizer que sua verve para o gracejo o aproximava
de grandes mestres, como o já citado Leandro e José Pacheco da Rocha.
Quando garimpava em documentos e
livros informações para montar o quebra-cabeças que redundou na biografia de
Leandro Gomes de Barros, Ari sempre compartilhava comigo os seus apontamentos,
pedindo sugestões e, por vezes, corrigindo e refazendo rotas. Queria que o
livro fosse um marco, pois considerava injustiça das maiores Leandro,
poeta-ponte do cordel, não contar com uma biografia de fôlego, à altura de seu
talento. Num dado momento, sugeriu que eu dividisse com ele a autoria do
projeto, o que, de pronto, recusei. E recusei por ser aquele o trabalho de sua
vida e eu, quando muito, cumpria apenas a missão de leitor de primeira hora, já
que dividíamos a mesma paixão pela literatura de cordel e a mesma admiração por
Leandro. Ari, inclusive, assinava suas postagens no blogue Acorda Cordel sob o pseudônimo Cancão de Fogo, em homenagem à maior
criação do paraibano genial que tanto nos inspirou. Acabei assinando um dos
textos de abertura do livro Leandro Gomes
de Barros, o Mestre da Literatura de Cordel (Queima-Bucha), e isso, para
mim, já foi motivo de muito orgulho.
Assinei, ainda a convite dele, os
prefácios dos livros que lançou pela Globo Livros, adaptações de clássicos
infantis ilustrados por Jô Oliveira. E sua versão do conto O Crime das Três Maçãs, das Mil
e Uma Noites, do Armazém da Cultura, além de termos trabalhado junto na
caixa temática 12 Contos de Cascudo em
Cordel e na confecção do folheto Cem
Anos da Xilogravura na Literatura de Cordel (Queima-Bucha), de 2007, hoje
uma raridade bibliográfica. Ele depois assinou o prefácio de minha versão do
romance O Conde de Monte Cristo(Nova
Alexandria), da coleção Clássicos em Cordel, e integrou o elenco da Antologia do Cordel Brasileiro (Global
Editora).
Ari forneceu ainda informações
preciosas e sugeriu leituras que descortinaram horizontes por ocasião da minha
pesquisa para o livro Breve História da Literatura
de Cordel (Claridade). Generoso, enviou-me também contos populares que
ouvira na infância, como o belíssimo O
Tesouro do Matuto, que fecha o livro Contos
Folclóricos Brasileiros, e os engraçadíssimos O Azar de São Pedro e Jesus e
São Pedro na Casa da Usura, ambos publicados entre os Contos e Lendas da Terra do Sol (Paulus). Lamentavelmente, ele não
publicou em vida a antologia de contos e anedotas Histórias que os Antigos me Contaram, reunidos em muitos anos de
pesquisa séria e de generosa partilha.
À sua esposa Juliana Araújo, aos seus
quatro filhos, Daniel, Mariana, Yuri e o caçulinha João Miguel e também aos
seus irmãos, pais e demais familiares e amigos, deixo o meu abraço de conforto
neste momento de grande tristeza.
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