terça-feira, 1 de novembro de 2016

Esconjuros portugueses contra bruxas

Por: José Joaquim Dias Marques
Lionel Lindsay, A Bruxa, xilogravura, 1924.
Como em grande parte do mundo, a noite de Halloween tem-se vindo a tornar uma tradição também em Portugal, e certas pessoas costumam aqui designá-la por "noite das BRUXAS", numa curiosa adaptação terminológica da tradição norte-americana (tradição essa de longínqua origem europeia, claro).

Tendo em mente essa nova (?) designação, de noite das bruxas, vou transcrever alguns ESCONJUROS (subgênero das orações tradicionais que inclui os textos destinados a afastar o mal) contra as BRUXAS, recolhidos por duas antigas alunas minhas da disciplina de Literatura Oral da Universidade do Algarve:

-1-

Informante: Fernanda Teresa Fernandes, 74 anos. Tem a 4ª classe.
Natural de Alfarrobeira, freguesia de S. Clemente, concelho de Loulé, distrito de Faro. Mora em Quarteira, concelho de Loulé.

Esconjuro recolhido nas Baceladas, freguesia de Quarteira, concelho de Loulé, distrito de Faro, em 24/4/2011, por Elisabete Andrade Reis.

Este esconjuro diz-se quando, na rua, se encontra alguém que se suspeita que é bruxa e nos pode deitar mau-olhado. A informante explica que o aprendeu com uma vizinha, em Quarteira.

A folha do alho tem três porras.
Tu és o Diabo que para mim olhas.
Ainda agora Nosso Senhor Jesus Cristo me viu.
Quero que tu vás para a puta que te pariu!

- 2 -

Outro esconjuro com o mesmo objetivo, da mesma informante, Fernanda Teresa Fernandes, recolhido também por Elisabete Andrade Reis, na mesma data do anterior:

Bruxa refinada,
Não tenho nada para te dar,
Senão o leite da Virgem
Ou o pão do altar.

- 3 -

Informante: Catarina Rosária, 85 anos. Foi trabalhadora rural. Analfabeta.
Natural de Algunha, freguesia de S. Barnabé, concelho de Almodôvar, distrito de Beja.
Recolhido em Várzea da Mão, concelho de Loulé, distrito de Faro, a 21/12/2002, por Elisabete Andrade Reis.

Este esconjuro recitava-se quando uma pessoa se cruzava com alguém que tinha fama de bruxa. Repetiam-se estas palavras até se estar a uma distância considerável da bruxa. Enquanto se dizia este esconjuro, colocava-se o polegar entre o dedo indicador e o dedo médio, segundo mostrou a informante, por gestos. A informante aprendeu este esconjuro com a tia e a avó.

Figas real!
Tu és de ferro,
E eu de aço.
Tu és bruxa, 
E eu te embaço.

- 4 -

Informante: Maria Rosa Guerreiro, 62 anos. Natural de Alte, concelho de Loulé, distrito de Faro. É costureira. Sabe escrever e ler, mas muito pouco.

Recitava-se quando uma pessoa se cruzava com outra que tinha fama de bruxa. A informante aprendeu com o avô e já ensinou à filha.

Quando se diz este esconjuro, a pessoa deve colocar o polegar entre o dedo indicador e o dedo do meio (segundo mostra a informante, por gestos) e só parar quando a bruxa se afastou.

Recolhido em Várzea da Mão, concelho de Loulé, distrito de Faro, a 21/12/2002, por Elisabete Andrade Reis.

Tu és de ferro
E eu sou de aço.
Tu és bruxa
E eu te embaço!

- 5 -

Informante: Lucília Maria Cabrita dos Santos, 54 anos. Natural de Castro Marim, concelho de Castro Marim, distrito de Faro. Foi aí que aprendeu este esconjuro, com as amigas, quando era adolescente.
Recolhido em Olhão, a 28/12/2004, por Cláudia Sofia Cabrita dos Santos.

Como se poderá ver, a funcionalidade desta versão é afastar o Diabo e não as bruxas. No entanto, o texto pertence sem dúvida ao mesmo esconjuro das versões nºs 3 e 4.

Tu és ferro e eu sou aço. 
Foge, Diabo, que te embaraço.

Um comentário:

J. J. disse...

Obrigado, Marco. Aqui no blog o textinho ficou bastante mais bonito.