Acaba de sair, pelo selo Edicom, mais um folheto de autoria de Pedro Monteiro, A Lenda do Cabeça de Cuia. Piauiense, Pedro revisita um personagem-símbolo do folclore do seu estado, o Piauí. As xilogravuras da capa e do miolo são de Lucélia Borges.
Abaixo, a apresentação que fiz e as primeiras estrofes:
O Cabeça de Cuia, assombração que
habita sob os leitos dos rios Parnaíba e Poti, no Piauí, chamou, desde cedo, a
atenção dos folcloristas, a começar pelo baiano Alfredo do Vale Cabral, que
assim o descreve: “É alto, magro, de grande cabelo que lhe cai pela testa e
quando nada o sacode, faz suas excursões na enchente do rio e poucas vezes
durante a seca. Come de 7 em 7 anos uma moça chamada Maria; às vezes porém
devora os meninos quando nadam no rio, e as mães proíbem que seus filhos aí se
banhem”. (Achegas ao estudo do folclore brasileiro, 1884). A
penitência, nascida de uma praga da mãe, duraria 49 anos. Luís da Câmara
Cascudo, em Geografia dos mitos brasileiros (1948), atribui à
lenda uma origem branca. O episódio da maldição materna aparece em lendas semelhantes,
de visível cariz religioso, a exemplo do Corpo-seco, que assombra, sem
descanso, o interior paulista.
Às observações dos mestres do
Folclore é preciso acrescentar, porém, uma hipótese. O formato de cuia,
símbolo da maldição, é o mesmo da Lua. O número 7, que, segundo Câmara Cascudo,
“a Cabala da Babilônia julgava misterioso e sinistro”, remete aos dias da
semana e aos ciclos lunares. As mais recentes pesquisas, como a feita pelo
autor deste folheto, Pedro Monteiro, destoam em parte das informações
registradas desde o século XIX. Quatro virgens já teriam sido devoradas pelo
monstro, o que indica um ciclo completo da Lua (o Cabeça de Cuia só ataca à
noite). A ligação da Lua aos ciclos da água é mais uma informação arcaica
diluída no mito. O número total de virgens remete ao Setestrelo, o agrupamento
de estrelas que os gregos chamavam Plêiades, filhas de Atlas e Pleione. Formam
a cauda da constelação de Touro, e a sua posição no céu se explica pela
perseguição a elas infligida pelo caçador Órion. A carne touro é
a alimentação do jovem Crispim, antes da metamorfose, e é com um osso corredor,
parte do fêmur, que ele mata a mãe. É possível, portanto, que a lenda do Cabeça
de Cuia derive de um mito sideral (o de Órion perseguindo as Plêiades), fundido
e refundido através dos tempos, que encontrou no Piauí, estado de grande
tradição na pastorícia, um reflexo poderoso nas águas de seus mais importantes
rios.
Eu peço vossa atenção
Aos versos que narro aqui,
São ricas oralidades
Num conto que recolhi
Junto ao povo ribeirinho
Das terras do Piauí.
Nas margens do Parnaíba,
Rio de rara beleza,
Sua paisagem revela
Encantos da natureza,
Na voz e crença do povo
O mito vira certeza.
Poti, outro grande rio,
De leito espetacular,
Tem correnteza serena
Com o dom de desnudar
Boa parte dos mistérios
Da história que vou contar.
Há no encontro dessas águas,
Além do deslumbramento,
Na foz desses dois gigantes
Vê-se com estranhamento,
Um monstro representado
Através de um monumento.
A arte do monumento
Retrata o jovem Crispim
Que a mãe amaldiçoou
Por um presságio ruim,
Como Cabeça de Cuia,
Foi este seu triste fim.
Diz a lenda que Crispim,
Depois que seu pai morreu,
Morava só com a mãe,
Da pesca sobreviveu,
Pois era o ofício do pai
E o único que ele aprendeu.
(...)
Suas últimas palavras
Ela proferiu assim:
— Por agir de forma rude,
Sem piedade de mim,
O seu futuro terá
A maldição como fim!
Como era já meio-dia,
Os anjos disseram amém!
Uma peitica cantou,
Logo em seguida um vem-vem...
Depois um rasga-mortalha
Marcou presença também.
Com o seu trinar sombrio
Um vento forte adentrou
Através de uma janela
E um mau-agouro lançou,
Até o seu santo de guarda
Caiu no chão e quebrou.
Contato com o autor:
(11) 99135-1919 - Tim
(11) 94113-6377 – Vivo
E_mail: pedromonteirocordel@gmail.com
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