Leandro Gomes de Barros e a carnaubeira plantada pelo poeta Arievaldo Viana. . |
LEANDRO E A CARNAÚBA
O escritor HUMBERTO DE CAMPOS plantou
um pé de cajueiro e fez disso o norte de seu livro de memórias. Eu plantei um
pé de CARNAÚBA. Dirão vocês que um cajueiro é mais útil. Eu diria que uma carnaubeira
é muito mais bonita. Imponente. Palhas abertas ao vento, lembrando o fole de um
acordeom. Planta do sertão. Tudo a ver comigo. Humberto vivia em Parnaíba,
cidade que o Piauí "tomou" do Ceará, impingindo de volta um Crateús
muito do mal-ajambrado.
Hoje, abri as janelas do meu
escritório para ver a chuva banhar a minha pequena carnaubeira e me lembrei...
Ela viverá dois séculos, se nenhum fela-da-gaita (descendente ou não) inventar
de cortá-la. Eu fico por aqui até o dia que Deus quiser. Amém!
A CHUVA é o alento maior do povo
nordestino e eu, cabra véi nascido e amamentado na fazenda Ouro Preto, recanto
que já foi Quixeramobim e hoje pertence ao município de Madalena, pleno Sertão
Central do Estado, vivo aqui nessa diáspora metropolitana lembrando todos os
dias dos meus avós, do meu gadinho de osso, da ova de curimatã e das palhas do
pé de Carnaúba na beira do riacho vermelho. Aquilo, sim, era vida.
O serrote dos Três Irmãos era o
cenário. Dizia o velho Chico Pavio que aquilo eram três reinos encantados e que
havia um dragão escondido no sopé do Olho D'água das Coronhas, onde eu ia
buscar água com meu pai nos primeiros anos de minha vida. O autor de meus dias
cantava trechos da 'Batalha de Oliveiros com Ferrabrás'. Eu pensava no banho
gostoso e demorado no açude dos Calixtos. "Eram doze cavaleiros/Homens
fortes destemidos...".
Leandro Gomes de Barros, o autor,
povoava a minha infância pela voz de meu pai. Seria melhor se ele cantasse
"Juvenal e o Dragão", que também sabe de cor. Rompe-ferro, nosso cachorro
de estimação, teve seu nome extraído de um folheto de Leandro. Olho para ele,
fiel e abnegado, e me lembro do "Cachorro dos Mortos". Eu, por minha
vez, era o próprio Cancão de Fogo, escanchado na cangalha do jumento, atento à
natureza, à poesia e ao cenário.
Sinto o cheiro da chuva que acabou de
cair. A carnaubeira está exultante, plena de verde e de vigor. Eu fico por
aqui, até o dia em que Deus for servido. Mas o mestre Leandro viverá mais
alguns séculos, pela sua poesia vigorosa e forte como o meu pezinho de
carnaúba, pelo seu pioneirismo e, sobretudo, por sua indiscutível genialidade.
Estou aqui, igual a chuva que acabou de cair, regando a obra do mestre.
Arievaldo Viana,
Caucaia, 31 de março de 2008.
Nota do blogue: O saudoso poeta Arievaldo Viana, amigo querido de obra vasta e vida breve, publicou esta crônica no fotolog Acorda Cordel (Portal Terra), que foi descontinuado. Daí o "quase" do título desta postagem. A foto da carnaúba foi enviada por Juliana Araújo, viúva do poeta.
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