quinta-feira, 23 de abril de 2020

O martírio de São Jorge




Há muitas versões para o martírio de São Jorge, um dos mais populares santos católicos, conquanto tenha sido “cassado”, junto a outros 200 santos, pelo Papa Paulo VI, depois do Concílio Vaticano II, em razão da fragilidade em que se assenta sua história. Diocleciano era o regente romano, e tinha sob o seu jugo a Palestina, para onde Jorge se dirigiu depois da morte de seus pais. Era soldado destacado, mas, durante uma perseguição, na qual teriam morrido 17 mil cristãos, renunciou às honras militares, vendeu tudo o que possuía, distribuindo o apurado entre os pobres, e passou a viver entre os seguidores de Cristo. Suas pregações ajudaram na conversão de muitos pagãos à fé cristã, o que irritou sobremaneira Daciano, governador das províncias do Oriente, incluindo a Palestina, que ordenou sua prisão. Como não abjurasse de suas crenças, Jorge foi levado ao “potro”, instrumento de tortura romano, espécie de armação de madeira que tinha esse nome por lembrar a forma de um cavalo.

A tortura incluía o dilaceramento de seus braços com forcados de ferro, queimaduras com tochas, aplicação de sal nas feridas e nas estranhas, que teimavam em sair. Mesmo em estado lamentável, à noite, uma luz inefável o envolveu e ele ouviu doces palavras de consolo que fortaleceram ainda mais o seu espírito. Daciano, não conseguindo dobrá-lo com torturas, recorreu a um poderoso mágico, que assegurou que o faria renunciar à sua crença e, se não o conseguisse, que o governador lhe cortasse a cabeça. Por duas vezes, o mágico obrigou o santo a sorver uma taça de vinho com um veneno poderoso. Protegido por Deus, antes de sorver o líquido, o santo fazia o sinal-da-cruz, resultando nulo o seu efeito. O mágico implorou, então, para que Jorge o batizasse e, em seguida, foi decapitado.
As torturas continuaram: Jorge foi levado a uma roda composta por espadas de dois gumes, mas esta quebrou-se tão logo entrou em contato com seu corpo. O juiz mandou que o jogassem num caldeirão cheio de chumbo derretido, mas Jorge saiu dele ileso, como quem sai de um reconfortante banho. Daciano então o exortou docemente a renegar o seu credo e sacrificar aos seus deuses, com o que Jorge fingiu concordar. A “conversão” de Jorge foi motivo de um pregão que reuniu quase toda a cidade de Diáspolis. No templo pagão, o santo ajoelhou-se e pediu a Deus que o ajudasse e, no mesmo instante, choveu fogo do céu, reduzindo o templo e todos que o ocupavam, com exceção do paladino, a cinzas.
Irado, Daciano chama Jorge à sua presença, acusando-o de feitiçaria, e queixa-se à sua mulher, Alexandrina. Esta repreende o marido com severidade, advertindo-o sobre o castigo que adviria de sua maldade. A mesma Alexandrina, depois de pedir que Jorge a fizesse cristã, foi barbaramente castigada pelo marido, que mandou que a pendurassem pelos cabelos e a surrassem. Jorge assegura à mulher que o sangue do martírio equivale à água do batismo e Alexandrina, rainha dos persas, depois de render a alma, foi recebida no Céu.

Jorge foi então arrastado por toda a cidade e teve a cabeça cortada. No retorno para o palácio, o cruel Daciano e todos os seus soldados morreram consumidos por um fogo vindo do Céu.

Seu martírio, segundo Jacopo de Varaze, se deu no ano do Senhor de 237. Tornou-se, séculos depois, padroeiro dos cruzados da Inglaterra e da França, e, pelo processo natural de convergência, outras lendas foram acrescentadas à sua hagiografia.

Um comentário:

Martatina disse...

Encantada com o seu blog Marco Haurélio!! E grata pelos tantos conhecimentos que tenho obtido com você e os colegas no curso "Retorno ao País da Infância!