sexta-feira, 22 de julho de 2011

Lançamentos de folhetos aditivam a literatura de cordel


O cordel vive uma fase efervescente. As duas principais editoras do gênero apresentam seus lançamentos.
A Tupynanquim, de Fortaleza, dirigida pelo poeta Klévisson Viana, chega com uma fornada que reúne nomes  como Bule-Bule (Duelo de bruxos ou a pomba e o gavião), Evaristo Geraldo e Pinto de Ouro (O Príncipe valente e a Princesa Encantada) e Zé Barbosa (História de Justino e o cachorro Joli).





















Outro lançamento é a coleção Pequena Sereia, que traz clássicos do grande escritor dinamarquês Hans Christian Andersen, recriados pela verve sempre arguta de Paiva Neves. Os títulos são A polegarzinha, O soldadinho de chumbo, O patinho feio e, claro, A pequena sereia. Paiva é autor de uma versão memorável de O príncipe e o mendigo, de Mark Twain, para a coleção Clássicos em Cordel da editora Nova Alexandria.


















A Luzeiro de Gregório Nicoló também traz novidades. Entre elas, um cordel picaresco de Franklin Maxado, Gracinha Corneteira, a Malasartes de saia, e Pergunta idiota, tolerância zero!, de Varneci Nascimento. Os dois são de temática jocosa.

terça-feira, 19 de julho de 2011

50 anos do poeta Moreira de Acopiara


















Sábado, 23 de julho, será um dia especial para o poeta Moreira de Acopiara. Além de comemorar cinqüenta anos, o autor lançará, pela Duna Dueto, a antologia poética O sertão é meu lugar. A convite de Neusa Borges, organizadora do evento, escrevi as seguintes estrofes:

O canto que encanta a muitos
Vem da terra de Iracema,
Em São Paulo desembarca,
Faz morada em Diadema
E escreve na Pauliceia
O mais bonito poema.

Enfrenta muita intempérie,
Supera medos, enganos,
Com versos bem escandidos,
Vai desvelando os arcanos,
Por isso merece aplausos,
Porque faz cinquenta anos.

Cada verso garimpado
É de fato joia rara,
É que semente que germina
E fertiliza a seara.
Receba nossos aplausos,
Moreira de Acopiara.

E, a convite do autor, escrevi um texto de orelha para o livro O sertão é meu lugar:

O notável escritor mineiro Guimarães Rosa, por meio de seu personagem mais célebre, o Riobaldo de Grande sertão: veredas, pronunciou a sentença fatal: “O sertão é o mundo.” Moreira de Acopiara, nascido no sertão-mundo do Ceará, de pia Manoel Moreira Jr., confirma o aforismo. Como boa parte dos nordestinos, arribou do sertão e veio dar com os costados na Pauliceia, mais precisamente em Diadema, no Grande ABC. Trabalhou como garçom, frentista, até que o chamado da poesia lhe apontasse a senda do cordel, que conhecera ainda na infância, quando teve a ventura de ver os seus primeiros versos avaliados por Patativa do Assaré. Este, ainda que lhe reconhecesse o talento, apontou os erros, comuns a todo poeta iniciante. Hoje, com centenas de folhetos publicados e pelo menos uma dezena de livros no currículo, Moreira apresenta mais um rebento. Mas este O sertão é meu lugar, diferente dos outros, é um livro-síntese: reúne poemas do autor, alguns tornados clássicos, como “ O banho de Mercês”, "Idades" e “O Nordeste é meu lugar”. E  o sertão, como um estado de alma, se faz presente em cada verso desta antologia.

Serviço

O coletivo de artistas de São Bernardo do Campo, a Editora Duna Dueto e o autor convidam para o lançamento do livro

O sertão é o meu lugar, de Moreira de Acopiara.
Quando: 23 de julho, sábado, a partir de 16h
Onde: Sociedade Cultural e Recreativa Alameda Glória
Rua Príncipe Humberto, 315, Vl. Duzzi - São Bernardo
Mais informações: 7431-7051 c/ Neusa Borges

segunda-feira, 11 de julho de 2011

Meus romances na 'Caros Amigos'



Renato Pompeu: De Anita Garibaldi ao Cordel, passando por Deus e a Ciência

A edição de junho da revista Caros Amigos, na coluna Ideias de Botequim, assinada pelo jornalista Renato Pompeu, traz uma lista de livros recomendados, entre os quais Meus romances de cordel, lançado este ano pela Global editora. Outros destaques são: A guerrilheira, romance sobre Anita Garibaldi, de João Felício dos Santos, lançado pela José Olympio Editora, e Conversa sobre a fé e a ciência, do Frei Betto com o cientista Marcelo Gleiser, com a colaboração de Waldemar Falcão. 

Clique aqui para ir ao site da Caros Amigos.

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Work shop de cordel no Tendal da Lapa


Da amiga Cleusa Santo recebi, por e-mail o seguinte convite, que agora divulgo:


Work Shop de Cordel
Com certificado
Dia:

16 de Julho de 2011

Das:

13 às 17 horas


        Progamação:

 ü  Das 13 às 14h - Pioneirismo do cordel – Poeta Josué Araujo

 ü  Das 14 às 14.30 - Recital de textos em cordel com a poetisa Cleusa Santo                                                         
 ü  Das 14 .30 às 15.30 Métrica do cordel com o poeta Josué  Araujo

 ü Das 15.30 às 16 h Cordel em outras modalidades com a poetisa Cleusa Santo

 ü  Das 16 às 16.15 intervalo para um café    

 üDas 16 .15 às 16 .50 construção de um  verso em cordel, com os participantes.

     No Tendal da Lapa
Rua Guaicurus 1100 ou entrada pela rua Constança 70

Bairro Lapa

Fone: 3862.1837


OBS: Inscrição no dia , chegar  15 minutos antes ou pelo  email



( Cleusa Santo)

quinta-feira, 30 de junho de 2011

O pássaro de fogo: uma lenda dos índios temiminós

Ilustração: Eduardo Azevedo

Mais uma vez vou à fonte
Das antigas tradições
Que formam a base das
Velhas civilizações,
E que, no tempo e no espaço,
Sem mostrar qualquer cansaço,
Lega-nos belas lições.

Esta lenda se refere
Aos índios temiminós.
Impelida pelo vento,
Ela chegou até nós.
Relatos encantadores
Nas vozes dos narradores,
Avós dos nossos avós.

O cenário desta lenda
Que envolve povos em guerra
Hoje abrange os municípios
De Cariacica e Serra:
No rico chão capixaba
Vivia um morubixaba
Que era o mais bravo na terra.

Era o pai duma princesa
Chamada de Jaciara,
Um primor da natureza,
Uma esmeralda tão rara,
Que um bravo temiminó,
Ao vê-la no mato só,
Seu coração quase para.

Mas havia um empecilho
Pra que o amor consumasse:
Os pais dos jovens jamais
Consentiriam no enlace.
Guaraci e Jaciara
Não se viam cara a cara,
Não se olhavam face a face.

O jovem ainda tentou,
Com presentes cordiais,
Agradar o pai da moça,
Porém, com planos fatais,
O destino não deixava,
Pois o cacique bradava:
— Somos de tribos rivais!

Não consentirei jamais
Nessa união malfadada.
Prefiro ver minha filha
Antes morta que casada
Com um vil temiminó,
Porque persigo sem dó
Essa gente desgraçada!

E recrutou os guerreiros
Que julgava de valor
Pra criar uma barreira
Com propósito traidor
De impedir que Guaraci
Chegasse perto dali,
Falasse com seu amor.

Todavia apareceu
Um pássaro misterioso,
Que do par apaixonado
Foi correio valioso:
Para a princesa levava
As cantigas que entoava
O guerreiro valoroso.

Do mesmo modo levava
As mensagens da princesa,
As juras de amor eterno
Adornadas de beleza.
O mesmo pássaro trazia
A bonita melodia
Da deusa da Natureza.

O mensageiro celeste
Vez ou outra os conduzia
A duas elevações,
Onde levava e trazia
As cantigas dos amados,
Segredos de apaixonados
Que só o pássaro sabia.

E nesse ir e vir constante,
Acharam de combinar
Uma fuga que pudesse
A vigilância burlar.
Porém o pai da princesa,
Desprovido de nobreza,
Um crime vai perpetrar.

Consultou os adivinhos
Mais importantes da aldeia,
Soube dos planos da filha,
Da fuga pra terra alheia...
Disse, espumando de ira:
— Eu não perdoo a mentira,
Pois tenho sangue na veia!

O chefe, então, conclamou
Um temível feiticeiro,
Que descreveu em detalhes
De Jaciara o roteiro,
Dizendo: — Bravo cacique,
Impedirei que ela fique
Feliz com o seu guerreiro.

(...)

Nota: A trágica história de amor entre um guerreiro temiminó e uma princesa de uma tribo rival deu origem a uma lenda com fortes cores europeias, apesar de retratar personagens indígenas. Assim como na lenda do frade e da freira, o castigo que vitima os jovens enamorados é a transformação em dois rochedos. O guerreiro é o Mestre Álvaro, morro imponente da cidade da Serra. A princesa é o Moxuara, localizado em Cariacica. O misterioso pássaro de fogo, que servia de correio aos dois, ainda pode ser visto, nas noites de São João, auxiliando os desventurados amantes, no único dia do ano em que recuperam a forma humana. 
___________
O pássaro de fogo é um dos poemas do livro Lendas do folclore capixaba (Nova Alexandria).

Direitos reservados ao autor.

terça-feira, 28 de junho de 2011

A lenda do Sumé - em cordel

O Sumé em ilustração de Eduardo Azevedo
Quando esta terra não era
Conhecida por Brasil
E a flecha não tinha sido
Vencida pelo fuzil,
Dos valentes goitacás
Lendas de guerra e de paz
Se espalhavam em cantos mil.

No sul do Espírito Santo,
Ao crepúsculo matutino,
Certa vez apareceu
Um estranho peregrino.
Enquanto o sol despertava,
Sobre as ondas caminhava
Um ser em tudo divino.

Tinha ele barbas sedosas
Como fios de cambraia.
Surgido do mar revolto,
Caminhava para a praia.
Os índios o contemplavam,
Os mais valentes se armavam,
Postando-se de atalaia.

Quando o sábio aproximou-se,
Todos logo se acalmaram,
Pois uma expressão bondosa
No rosto dele notaram.
Contemplando o ancião,
Arcos e flechas no chão
De imediato lançaram.

Sumé, era esse o nome
Do estranho visitante,
Que talvez tivesse vindo
De um mundo muito distante,
E ali, naquele lugar,
Dispôs-se ele a ensinar
Um segredo relevante.

Pele branca, olhos azuis,
Suavidade, brandura,
As barbas caíam aos pés
Da divina criatura
Que veio aos índios mostrar
Que deviam começar
As lidas da agricultura.         

Dizia: — Meus filhos, vejam
Esses grandes empecilhos:
Somente pedras e espinhos
Se espalham por esses trilhos,
Mas a Terra é generosa
E como mãe carinhosa
Quer alimentar seus filhos.

Cacem, pesquem, colham frutos,
Com que vão se alimentar.
Aquilo que hoje tem muito
Amanhã pode faltar.
Portanto, tenham certeza,
Não tirem da Natureza
Mais do que ela pode dar.

Quem antes fora guerreiro,
Em batalhas inclementes,
Agora seguia o sábio,
De gestos tão comoventes
E a terra logo se abria,
Generosa, e recebia
As mais diversas sementes.

Passaram os dias, os meses,
Naquela semeadura,
Que proporcionaria
Uma condição segura
Ao povo que ignorava,
Mas agora dominava
Primitiva agricultura.

A terra havia mudado:
Frutos, cereais surgiam,
Cará, milho, mandioca,
Que os índios não conheciam.
Deslumbrados festejavam.
Simplesmente duvidavam
Do que os seus olhos viam.

Sumé também se alegrava,
Findos os tempos cruéis.
As feras mais bravas vinham,
Mansas, deitar-se aos seus pés.
A Natureza sorria
Ao povo, que a protegia
Como devotos fiéis.

Mas o pajé invejoso,
Um grande temor aflige-o:
Com a chegada do santo,
Perdera muito prestígio.
Movido pela vaidade,
Conclama a comunidade
Para que entre em litígio.

— Como pode? — perguntava —
Um povo antes guerreiro
Abaixar-se servilmente
Às ordens de um forasteiro?
Onde está sua bravura?
Perdeu-se pela loucura
Desse estranho aventureiro!

Ele quer nos tornar fracos
Pra depois nos dominar!
Assim, as outras nações
Poderão nos derrotar.
Atentem para o que digo:
Expulsemos o inimigo
De volta pra o seu lugar.

Nem todos deram apoio
Às palavras do pajé,
Mas este homem invejoso,
Movido pela má fé,
Espalhou maledicência,
Pagando com violência
A bondade do Sumé.

(...)

Nota: O Sumé é um personagem da mitologia tupi, um civilizador branco que teria vivido entre os índios, aos quais ensinou, entre outras coisas, o cultivo da terra. Mas, passado o tempo, vendo-se perseguido pelos  tupinambás, retirou-se para a região andina. A rota do Sumé ficou conhecida como Peabiru, o Caminho da Montanha do Sol. O fato que descortinou a lenda teria ocorrido bem antes da chegada dos portugueses ao Brasil.  

Os padres jesuítas, encarregados da catequese dos índios desde o século XVI, identificaram o personagem com o apóstolo Tomé, que teria atravessado o Atlântico e pregado o cristianismo entre os primeiros habitantes do território que viria a ser o Brasil.

A lenda recontada em nosso livro, no entanto, descreve um ancião que surge no mar e caminha em direção à terra, onde é bem recebido pelos índios (goitacás), a quem ensina os segredos da agricultura. Sua expulsão se deve aos ardis de um pajé invejoso. Essa narrativa, de clara reelaboração literária, aparece no livro Lendas capixabas, de Maria Stella de Novaes. O Sumé termina por retornar pelo mesmo caminho, o Atlântico, deixando desolados os goitacás, punidos por sua ingratidão.
__________
A Lenda do Sumé é um dos poemas do livro Lendas do Folclore Capixaba (Nova Alexandria).

domingo, 26 de junho de 2011

Um folheto de cordel e a possível origem do personagem João Grilo

Folheto editado pela Tupynanquim
com capa de Klévisson Viana

Théo Brandão, folclorista alagoano de nomeada, no estudo Seis contos populares do Brasil, dedicou várias páginas a um conto de comprovada universalidade. Não só o conto, mas o seu protagonista também aparece em vários lugares. A história do adivinhão que se vale mais da sorte do que da astúcia vem da mesma seara onde Câmara Cascudo recolheu Adivinha, adivinhão, arrolado entre os Contos tradicionais do Brasil.  O motivo central chegou-nos de Portugal, embora seja corrente na tradição oral de vários países, como Itália, França, Noruega e até mesmo a distante Mongólia. Encontramos, ainda, O velho e o tesouro do rei, dos Contos populares do Brasil, de Silvio Romero, e O Dr. Grillo, dos Contos da Carochinha, do pioneiro Figueiredo Pimentel. As ocorrências são muitas, incluindo até uma variante alagoana, Estória de João Grilo, recolhida e divulgada por Théo Brandão, em 1954, reproduzida depois no estudo já citado.

O adivinhão que recebe do rei a incumbência de encontrar um ladrão misterioso é personagem de um folheto de autoria de Pedro Monteiro: João Grilo, um presepeiro no palácio.  É o mesmo amarelinho de incontáveis histórias de cordel, a começar pelo clássico Proezas de João Grilo, de João Ferreira de Lima, publicado originalmente como Palhaçadas de João Grilo, em 1932. E que, em 1956, entrará, com pompa e circunstância, para a história do teatro brasileiro como o protagonista da peça Auto da Compadecida, de Ariano Suassuna.

Personagem encontradiço nos contos populares portugueses, nas coleções de Consiglieri Pedroso (História de João Grilo) e Teófilo Braga (João Ratão ou Grilo), a menção mais antiga que conheço está na introdução do Pentamerone(1634-36), de Giambattista Basile. Este autor nos fala, de passagem, de certo Maestro Grillo, protagonista de uma obra cômica, Opera nuova piacevole da ridere de um villano lauratore nomato Grillo, quale volse douentar medico, in rima istoriata (Veneza, 1519). Grillo, fingindo-se de médico, faz com que uma princesa sisuda ria pela primeira vez. Angelo de Gubernatis, na Mitologia zoológica, segundo Teófilo Braga, afirma: “Na Itália,  quando se propõe um enigma para ser adivinhado, ajunta-se ordinariamente como conclusão as palavras – Indovinala, grillo!  (adivinha, grilo)”.[1] Orientalista, Gubernatis, fazendo coro aos estudiosos de seu tempo, associa a expressão ao idiota fingido que acaba por revelar-se esperto, interpretando-o como o sol que, mesmo envolvido na nuvem, ou durante a noite, a tudo vê. Um evidente exagero. Mas a expressão popular vem ao encontro do João Grilo adivinhão que figura, além do folheto de Pedro Monteiro, na última parte das Proezas de João Grilo.
Xilogravura de Erivaldo para a Antologia do Cordel Brasileiro (Global Editora)


Então, reproduzo, abaixo, um trecho do folheto de Pedro Monteiro que, pelas  evidências apresentadas, tem tudo para se tornar um cordel atemporal. Trata da saída de João Grilo do sertão e de sua chegada à corte, onde, por obra do destino, torna-se adivinho:

Largando-se mundo afora,
Com seu pobre matulão,
Pensando vencer na vida
Inventou a arrumação,
De oferecer serviços
Dizendo-se adivinhão.

Depois de andar mil léguas,
Um palácio ele avistou,
Pediu para pernoitar,
O rei de pronto aceitou.
Foi então que o João Grilo
Ligeiro se apresentou.

Como um bom astucioso
Passou-lhe logo a conversa!
O rei ficou inseguro
Não vendo ali controversa;
Mesmo se achando cercado
De muita gente perversa.

Prontamente acreditando
Ser ele um adivinhão,
Disse-lhe: — Meu bom rapaz,
Vens em boa ocasião;
Vejo que este palácio
Está cheio de ladrão.

Tenho notado o sumiço
De joia e de muito ouro,
Diamantes dos mais raros
Avaliado um tesouro,
Eles não têm dado tréguas
Nem pros tapetes de couro!

E ordenou a João Grilo:
— Você não entre em dilema,
Descobrirá os larápios,
Desvendará seu esquema.
Se não descobrir, verá
O tamanho do problema!

Porque se não o fizer,
Não sairá daqui vivo...
E trate de adivinhar
Se não, terei um motivo
Pra querer sua cabeça,
Ou tomá-lo por cativo.

O autor não se esquece de  citar uma das fontes a que recorreu: o grande etnógrafo Câmara Cascudo:

Mestre Câmara Cascudo
 Fez a catalogação
 Desta pérola recolhida
 Na fonte da tradição,
 Fincada lá nos guardados
 Da nossa imaginação



[1] BRAGA, Teófilo. Contos tradicionais do povo português, v. 1, p. 271.

quinta-feira, 23 de junho de 2011

O Herói de Três Faces

Capa de autor desconhecido (ao menos para mim,
que, ao chegar à Luzeiro, já a achei pronta)
Capa de Klévisson Viana  para a segunda
edição do romance
Gravura de Luciano Tasso para a obra
Meus romances de cordel (Global )

Tenho, como muitos sabem, um carinho especial pelo romance O herói da Montanha Negra. O motivo: leia a nota introdutória ao romance publicada no livro Meus romances de cordel, São Paulo: Global, 2001, p. 24:

O herói da Montanha Negra foi escrito em 1987. Foi o primeiro texto em cordel que escrevi e considerei publicável. Guardo, com muito carinho, os originais, que trazem alguns desenhos também meus. A inspiração? Mitos da Grécia Antiga, a HQ A Espada Selvagem de Conan e filmes do gênero sword and sorcery (“espada e bruxaria”). Em 1989, enviei o texto datilografado à editora Luzeiro, de São Paulo. Poucas semanas depois, recebi de volta o texto, acompanhado de uma carta do então diretor da editora, Arlindo Pinto de Souza, em que lamentava não poder publicá-lo devido à grande quantidade de originais no prelo. Em 2005, a convite de Gregório Nicoló, novo proprietário da Luzeiro, assumi o departamento editorial. No início de 2006, saiu a primeira edição do cordel, com capa em policromia. Em 2009, veio a segunda edição, com capa assinada por Klévisson Viana.”

E, ratificando o que eu disse, Vilma Mota Quintela, que assina a apresentação do livro (págs. 14-15), ressalta a presença de elementos que, direta ou indiretamente, remetem à mitologia greco-romana:

 “Dentre as formas da cantoria, a sextilha, a mais usada na literatura de cordel, é também a forma privilegiada no romance. Como um seguidor declarado da escola de Leandro, Marco Haurélio dedica atenção especial a essa modalidade. No ponto em que se encontra a sua produção, podese dizer que sobressai, no seu repertório, o romance de aventura e encantamento, um dos filões também muito explorados por poetas como Manoel D’ Almeida Filho, Severino Borges e Minelvino Francisco Silva, entre outros expoentes da escola tradicional. Quatro dos cinco romances aqui apresentados situam  se nessa categoria. No primeiro destes, O herói da Montanha Negra, o autor articula elementos remanescentes da narrativa de aventura medieval, do gênero capa e espada, com motivos do conto oral tradicional, enriquecendo a narrativa com referências à mitologia grega. O enredo traz a história de um jovem aventureiro que, munido apenas de sua espada, enfrenta diversos obstáculos, naturais e sobrenaturais, para resgatar a princesa enclausurada. No romance, os nomes Glauco e Climene, atribuídos ao herói e à princesa, remetem residual e casualmente à mitologia grega, já que o enredo traz a estrutura e os motivos narrativos característicos do conto fantástico  maravilhoso tradicional, com análogos em coleções eruditas portuguesas e brasileiras. A referência à mitologia grega, nesse caso, vem a enriquecer o enredo de aventuras, chegando este ao clímax em passagens como a da travessia do riacho Eterno pelo herói, que lembra a travessia do Aqueronte por heróis mitológicos como Hércules e Orfeu. No trecho a seguir Glauco derrota o mastim, associado, pelo narrador, ao cão Cérbero, guardião do Hades:

          (...)
Naquela triste montanha
Nascia o riacho Eterno,
Que descia numa gruta
E desaguava no Inferno,
Com suas águas ferventes
Que percorriam o Averno.

Glauco se aproximou
Do rio amaldiçoado
E subiu na frágil ponte
Pra chegar do outro lado,
Ansioso pra enfrentar
O monstro endemoninhado.

Essa ponte o conduziu
A uma caverna escura –
Nela o moço penetrou
Através duma abertura,
Mas lá dentro o esperava
Uma estranha criatura.

Esse ser era um mastim
Com cauda de escorpião,
Escamas por todo o corpo
E as garras de leão,
Mais horroroso que Cérbero,
O tartáreo guardião.”


***
Conheça, clicando aqui, o blog do meu novo livro livro, Contos e Fábulas do Brasil.

Cordéis atemporais: Vicente, o Rei dos Ladrões

A história, em sua última parte, que envolve o saque ao tesouro do rei, consta de um conto popular egípcio de cerca de 3.000 anos, O tesouro de Ramsés, o qual chegou ao poeta, por meio de uma versão oral que ele habilmente costurou na bem urdida trama do romance. Encontramos episódios como o do sacrifício do parceiro preso numa armadilha e o do ferimento acidental para disfarçar o choro pelo morto, que denunciaria o ladrão. Como boa parte dos espertalhões, Vicente é apresentado, nas primeiras edições impressas como “professor de Cancão de Fogo”, conforme salientado no subtítulo, que foi sensatamente suprimido nas sucessivas edições publicadas pela editora Prelúdio desde 1955.

Nos estandes que montei já ouvi mais de uma vez, ao reencontrar o lendário Vicente, um leitor declamar, emocionado, as estrofes de abertura.

Todo o mundo traz o dom,
Conforme diz o rifão:
Existe quem traga até
O dom para ser ladrão –
Sendo pra roubar cavalo,
Traz um cabresto na mão

Neste drama, eu apresento
Vicente, o Rei dos Ladrões,
Que, em todos caloteiros,
Ele passava lições –
Até em Cancão de Fogo,
Segundo as opiniões.

Vicente, o rei dos ladrões é um dos clássicos da Coleção Luzeiro de Literatura de Cordel.

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terça-feira, 21 de junho de 2011

Acorda, São João!



O São João dorminhoco da tradição popular, que segura o mundo, aparece na canção São João Dormindo, interpretada pelo inesquecível Elino Julião e composta por Nito Canhete e Aleixo de Freitas:

Acorda meu São João, acorda
Acorda para ver seu dia
Rua enfeitada, fogueira acesa
Quentão na mesa e muita alegria

A noite é linda, o céu estrelado
Os namorados tão se divertindo
Bomba estourando, balão subindo
E não sei porquê meu São João dormindo

A lua vem surgindo cor de prata
Por trás da mata uma estrela brilhou
Para continuar nossa amizade,
Vamos ser cumpadre que São João mandou

Imagem: São João Batista (do mestre do Barroco, Caravaggio)

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