quinta-feira, 23 de junho de 2011

O Herói de Três Faces

Capa de autor desconhecido (ao menos para mim,
que, ao chegar à Luzeiro, já a achei pronta)
Capa de Klévisson Viana  para a segunda
edição do romance
Gravura de Luciano Tasso para a obra
Meus romances de cordel (Global )

Tenho, como muitos sabem, um carinho especial pelo romance O herói da Montanha Negra. O motivo: leia a nota introdutória ao romance publicada no livro Meus romances de cordel, São Paulo: Global, 2001, p. 24:

O herói da Montanha Negra foi escrito em 1987. Foi o primeiro texto em cordel que escrevi e considerei publicável. Guardo, com muito carinho, os originais, que trazem alguns desenhos também meus. A inspiração? Mitos da Grécia Antiga, a HQ A Espada Selvagem de Conan e filmes do gênero sword and sorcery (“espada e bruxaria”). Em 1989, enviei o texto datilografado à editora Luzeiro, de São Paulo. Poucas semanas depois, recebi de volta o texto, acompanhado de uma carta do então diretor da editora, Arlindo Pinto de Souza, em que lamentava não poder publicá-lo devido à grande quantidade de originais no prelo. Em 2005, a convite de Gregório Nicoló, novo proprietário da Luzeiro, assumi o departamento editorial. No início de 2006, saiu a primeira edição do cordel, com capa em policromia. Em 2009, veio a segunda edição, com capa assinada por Klévisson Viana.”

E, ratificando o que eu disse, Vilma Mota Quintela, que assina a apresentação do livro (págs. 14-15), ressalta a presença de elementos que, direta ou indiretamente, remetem à mitologia greco-romana:

 “Dentre as formas da cantoria, a sextilha, a mais usada na literatura de cordel, é também a forma privilegiada no romance. Como um seguidor declarado da escola de Leandro, Marco Haurélio dedica atenção especial a essa modalidade. No ponto em que se encontra a sua produção, podese dizer que sobressai, no seu repertório, o romance de aventura e encantamento, um dos filões também muito explorados por poetas como Manoel D’ Almeida Filho, Severino Borges e Minelvino Francisco Silva, entre outros expoentes da escola tradicional. Quatro dos cinco romances aqui apresentados situam  se nessa categoria. No primeiro destes, O herói da Montanha Negra, o autor articula elementos remanescentes da narrativa de aventura medieval, do gênero capa e espada, com motivos do conto oral tradicional, enriquecendo a narrativa com referências à mitologia grega. O enredo traz a história de um jovem aventureiro que, munido apenas de sua espada, enfrenta diversos obstáculos, naturais e sobrenaturais, para resgatar a princesa enclausurada. No romance, os nomes Glauco e Climene, atribuídos ao herói e à princesa, remetem residual e casualmente à mitologia grega, já que o enredo traz a estrutura e os motivos narrativos característicos do conto fantástico  maravilhoso tradicional, com análogos em coleções eruditas portuguesas e brasileiras. A referência à mitologia grega, nesse caso, vem a enriquecer o enredo de aventuras, chegando este ao clímax em passagens como a da travessia do riacho Eterno pelo herói, que lembra a travessia do Aqueronte por heróis mitológicos como Hércules e Orfeu. No trecho a seguir Glauco derrota o mastim, associado, pelo narrador, ao cão Cérbero, guardião do Hades:

          (...)
Naquela triste montanha
Nascia o riacho Eterno,
Que descia numa gruta
E desaguava no Inferno,
Com suas águas ferventes
Que percorriam o Averno.

Glauco se aproximou
Do rio amaldiçoado
E subiu na frágil ponte
Pra chegar do outro lado,
Ansioso pra enfrentar
O monstro endemoninhado.

Essa ponte o conduziu
A uma caverna escura –
Nela o moço penetrou
Através duma abertura,
Mas lá dentro o esperava
Uma estranha criatura.

Esse ser era um mastim
Com cauda de escorpião,
Escamas por todo o corpo
E as garras de leão,
Mais horroroso que Cérbero,
O tartáreo guardião.”


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Cordéis atemporais: Vicente, o Rei dos Ladrões

A história, em sua última parte, que envolve o saque ao tesouro do rei, consta de um conto popular egípcio de cerca de 3.000 anos, O tesouro de Ramsés, o qual chegou ao poeta, por meio de uma versão oral que ele habilmente costurou na bem urdida trama do romance. Encontramos episódios como o do sacrifício do parceiro preso numa armadilha e o do ferimento acidental para disfarçar o choro pelo morto, que denunciaria o ladrão. Como boa parte dos espertalhões, Vicente é apresentado, nas primeiras edições impressas como “professor de Cancão de Fogo”, conforme salientado no subtítulo, que foi sensatamente suprimido nas sucessivas edições publicadas pela editora Prelúdio desde 1955.

Nos estandes que montei já ouvi mais de uma vez, ao reencontrar o lendário Vicente, um leitor declamar, emocionado, as estrofes de abertura.

Todo o mundo traz o dom,
Conforme diz o rifão:
Existe quem traga até
O dom para ser ladrão –
Sendo pra roubar cavalo,
Traz um cabresto na mão

Neste drama, eu apresento
Vicente, o Rei dos Ladrões,
Que, em todos caloteiros,
Ele passava lições –
Até em Cancão de Fogo,
Segundo as opiniões.

Vicente, o rei dos ladrões é um dos clássicos da Coleção Luzeiro de Literatura de Cordel.

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