Por Penélope Martins, no blog Toda hora tem história
A cultura popular brasileira é composta por uma diversidade de elementos geográficos que relatam as tendências da vida na região. Não é pra menos, o país se apresenta como continente “gigante pela própria natureza”. De extremo norte na curva nordeste do mapa que se vê lá no alto da cartografia, até os pontos mais longínquos no sul, Brasis tantos.
Porém, considerando mais de oito milhões e meio de quilômetros quadrados, vislumbra-se uma inexplicável unidade em ser brasileiro.
Reentrâncias, ápices, vales e águas. Brasil que não avança somente com planaltos e planíceis, mas que alcança os céus com serras.
Repare a Serra da Contamana no Acre, na curva desenha um coração, enquanto na Bahia, outras serras como a do Bugio, riscada pela mesma mão, e a Sincorá, no centro da Chapada Diamantina, onde o vento brinca com as saias das meninas.
Não nega a geografia da Serra Vermelha que adormecidos guerreiros aguardam o dia da batalha. Já na Ibiapaba e na Farofa, cachoeiras recolhem suas águas para orvalhar madrugadas.
Serra do Mar diz minha infância. Quantas noites estreladas, o asfalto com olhos de gato, descendo as curvas de Santos para ir ter com o avô e as tias meus dias de férias.
Serras que tocam o sol, serras de luar e por detrás daquela serra o canto do poeta transborda a cor da mata, plumas de aves, cheiros de flores tantas, mel de frutos da nossa terra.
Araçá, alecrim, pinha, bananeira, sereno e namoro. A poesia das serras faz cantar rodas antigas, que contavam nossos avós e os avós deles também.
Quadras populares para brincadeiras de roda, lenço na mão e moça bonita. Histórias que se passam no céu, caminhos de estrelas cadentes, histórias que se passam na Serra que mapeia o Brasil com doces rebuscados geográficos.
Eu subi naquela serra
Com alpercatas de algodão
A alpercata pegou fogo,
Eu desci com os pés no chão.*
Se me coubesse escolher uma cor para pintar as quadrinhas que desenham nossas serras, eu pintaria de rosas em variados tons, mas salpicava com azuis e amarelos também. Os desenhos seriam bordadinhos, caseados, ponto a ponto como fazem senhoras bordadeiras e mulheres rendeiras.
Triste de mim, o livro de quadras não escrevi, nem os desenhos fui eu quem fiz. Felizmente fizeram tão bem os dois, afinados em cores e rimas, que é como se fosse meu e teu o livro que se anuncia…
Taisa Borges conta que fez tinta caseira de amora e recriou cores das frutas de época para compor em pincelas soltas uma expressão própria que conversasse com as rimas cantadas por Marco Haurélio.
Com sua caneta, *Marco Haurélio tem esmero do cancioneiro popular autêntico, sem reproduções caricatas de Brasil, ao contrário, sua poesia traz fiel beleza da vida sertaneja na Bahia e com a qual, inexplicavelmente (ao menos no meu caso, já que nasci e me criei em São Paulo) nos identificamos e fazemos cantar com ele.
LÁ DETRÁS DAQUELA SERRA, com quadras e cantigas populares, composição do poeta e folclorista Marco Haurélio, baiano da Ponta da Serra, junto com Taisa Borges, uma menina que borda pinturas escondendo inúmeras palavras para contar outras histórias. Mais um ponto no céu de estrelas da Editora Peirópolis, de São Paulo.
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